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Agora sabia que realmente existia e ofereceu-
lhe
um lindo sorriso repleto de gratidão e ternura, a única
coisa que realmente conseguia fazer e que era
somente
sua
e podia partilhar com quem quisesse,
principalmente com essa pessoa, esse alguém que a
renovou.
- Que faço aqui e onde estou? O que se passou
e desde quando estou aqui? Perguntou ela, mais
uma
vez! O desassossego começava a fazer-se notar
dentro de si.
- Calma. Respondeu ele com
a sua voz calma… e continuou a brincar com ela, direcionando-lhe
um olhar lindo e carinhoso.
Francisca olhou para a máquina, depois para a
enfermeira e outra vez para o homem de branco,
esperando por uma resposta.
Ele expressou
um ar
mais sério e olhou à sua volta,
numa troca de olhares repentinos, entre ele e a enfermeira. Francisca pressentiu
que
algo rompia a escuridão desse olhar. Então, ele perguntou a Elsa
se já
lhe tinha molhado os lábios, ao que ela fez um
sinal negativo, com a cabeça.
- Quer beber um pouco
de
água? Perguntou- lhe ele com amabilidade.
Francisca acenou-lhe
que sim, pois sentia a garganta ressequida…
talvez depois ficasse mais descontraída
e com
coragem de lhe perguntar o
desejado.
Francisca observou-o enquanto colocava num copo de água algumas gotas de um líquido amarelo, do frasco que a enfermeira lhe estendeu. Pegando-lhe na cabeça, levantou-a um pouco e, com delicadeza,
levou-lhe o copo à boca.
Ela mirou o conteúdo,
receosa pois parecia conter
água incomum, meio acastanhada, mas ele acalmou-a dizendo…
- Não se preocupe
pois
são apenas vitaminas
para
melhorar… não se esforce por falar mais, por agora chega. Descanse hoje
que amanhã falamos e
fará
as perguntas que
quiser, está bem?
Logo que acabou de dizer estas palavras, virou-se na direção da porta e alguns segundos depois, saiu.
Após a ingestão da
bebida amarelada, Francisca
abanou a cabeça e fez uma
careta, pois
tinha um sabor esquisito, misturando o doce e o
amargo. Depois recostou-se e soube-lhe tão bem sentir um
líquido a escorregar
suave e novamente pela garganta. O seu olhar percorreu de novo o
espaço,
onde se encontrava e deteve-se
num objeto
bem familiar, que lhe tinha passado
despercebido, uns segundos antes.
Sentado aos pés da cama, lá estava ele, o bem conhecido ursinho de peluche. A sua curiosidade
despertou, precisava urgentemente
de
saber o porquê disso tudo.
Passados alguns segundos, a fraqueza
regressou ao seu corpo. Depois de fechar os olhos,
ouviu os passos da enfermeira a sair e cedeu à tentação de
dormir, outra vez. De entrar novamente
num espaço alugado à fantasia e deixou-se levar nessa viagem.
Foi uma noite bastante perturbada,
que parecia não querer terminar
nunca. Dormia aos
poucos e acordava sobressaltada, somente porque nascia, lentamente, a sombra da última imagem
escondida no cantinho da memória. Igual ao quadro que
se vinha revelando, cada vez maior e mais
nítido.
A gargalhada da criança lançada ao ar, era agora prisioneira na sua mente, depois o som do tiro, ecoando
nos seus ouvidos e na sua cabeça,
faziam-na mergulhar no vazio assustador. Estes
acontecimentos teimavam em ficar e eram um
autêntico pesadelo.
Os gritos, os sussurros, os risos, o sangue, as sombras que começavam
pequeninas e depressa se transformavam em grandes. Ora se faziam escuras ora claras, e por fim as gargalhadas que ainda ecoavam
na sua cabeça. Tudo se misturava
e causava um enorme turbilhão dentro de si.
Francisca tentou mexer-se,
mas
em vão. As dores impediam-na e o seu corpo não obedecia a nenhum movimento. Aquela era uma lembrança
demasiado confusa e que atormentava
o seu
descanso.
Ela sabia que continuava ali, mas tudo
parecia irreal, sonho e pesadelo.
Pouco tempo depois,
a aurora entrou pela
janela dentro rompendo a noite. Francisca sabia que
era
Outono, porque reparou nas folhas que caíam devagarinho das árvores quase despidas, do jardim
em
frente à janela do quarto. Apreciava com gosto,
o vento que suavemente
as fazia dançar e imaginava ser ela a dançar com o vento, entre as folhas, e ao som de uma
música calma.
Francisca continuava com o corpo dormente, mas a memória começava a despertar
e a
sensação de pavor não a largava.
Tinha medo, muito
medo do passo que viria
a seguir. Sentia-se receosa
do que poderia estar escondido além da escuridão que
preenchia o vazio da sua mente.
Francisca esforçou-se
mais uma vez para
reavivar a memória e
tentar descobrir
o que a aguardaria brevemente. Precisava muito saber o que a amedrontava, precisava de saber a verdade.
Colocava perguntas a si própria, às quais
respondia em pensamento.
Ao mesmo tempo, olhava
em seu redor, na esperança de descobrir mais alguma pista… o peluche, kiko, se estava
ali, tinha de haver uma razão e ela
queria descobri-la.
Quem era?
Isso sabia...
Onde estava? Também, pois perante o que ouviu e do que
vagamente se lembra, só podia ter acabado numa tragédia. Que fazia ela naquele lugar e há quanto tempo? Não imaginava... Mas estava prestes a descobrir, e por essa razão, o seu nervosismo
aumentava.
O seu olhar prendeu-se no ursinho azul… o que faria ele naquele lugar? O seu pensamento perguntava, mas ela continuava sem saber a
resposta, da sua primeira pista.
Francisca sentiu
um arrepio ao reavivar a última imagem guardada no seu cérebro, aquela que se recusava a acordar. A maneira simpática e amorosa de como o menino, conhecido, a abordou dizendo-lhe:
- Mãos ao ar! Rápido ou disparo!
Depois, ouviu a
gargalhada cheia de felicidade, lançada ao ar por aquela criança de
nome Luizinho.
Ela
sorriu, ao mesmo tempo que deu um pequeno
passo para se
voltar para o menino,
quando ouviu e sentiu um disparo que
tudo parou. A luz da sua memória apagou-se naquele instante.
Sentiu uma dor tão profunda ao ressuscitar os
momentos
que a lançaram para o vazio, que estremeceu de medo e de dor, só de pensar.
Francisca esticou-se na tentativa de conseguir
alcançar o peluche azul, que estava sentado, aos pés da sua cama. Quando satisfez a
vontade de o
agarrar olhou-o bem, nos olhos, e com o seu olhar perguntou-lhe:
- O que significa a tua presença aqui?...
Sim, ela lembrava-se perfeitamente bem
quando e a quem tinha oferecido aquela lembrança…
só não percebia o que fazia ali e agora. Abraçou-o tão fortemente, como se fosse a própria pessoa que ali estivesse e, ao mesmo tempo, quisesse aliviar o pavor que
habitava nela.
Já era manhã, talvez perto das nove… calculava
ela, visto estar na hora do pequeno-almoço. Nessa altura, foi ajudada
a escolher uma posição
diferente, talvez mais cómoda,
para assim comer qualquer coisa, aconchegando
um pouco mais o
estômago.
Foi obrigada a comer umas bolachas e beber um pouco de leite.