DEIXO AQUI MAIS UMA PARTE DO MEU LIVRO, FICA TAMBEM O LINK PARA QUEM QUIZER https//www.chiadoeditora.com/livraria/o-perfeito-do-imperfeito
Ficou com
muitas caixas de chocolates,
as quais fez questão
de
repartir,
pelas enfermeiras amigas e por mais algumas amizades, feitas naquele hospital. Um ramo de lindas rosas amarelas
e outro
de flores campestres,
enfeitavam o quarto. Recebera
também, dos sobrinhos, um frasco de perfume com um agradável
aroma.
Tinha sido extremamente agradável para ela receber aquelas visitas que lhe trouxeram a alegria que tinha perdido.
Alexandra
era mais velha que Alberta, dois
anos, mas casou e engravidou depois da
irmã.
Teve gémeos, um casal, que agora tinham vinte e
seis meses e eram a doçura da família. Além de serem lindos e engraçados tentavam imitar tudo e todos.
Estavam a ficar demasiado
traquinas, pois
estavam na idade de
o ser.
Alexandra
e a
irmã insistiram
em que ela fosse viver com elas até melhorar, pois moravam ao
lado uma da outra.
Sendo assim, podia ficar na
casa daquela que preferisse, o tempo desejado, até
a recuperação ser total.
Mas Francisca, generosamente,
recusou a oferta, bastante agradecida. Simplesmente
não queria acomodar-se a ninguém nem a nada,
recusava depender dos outros ou sentir-se um
peso. Evitava, tão
simplesmente, perturbar.
As certezas transformaram-se em dúvidas, mas depois de dias sem resultados positivos,
as dúvidas passaram a esperanças. Pensava no rumo que teria
de dar à sua vida. Não queria ser um fardo para
ninguém, disso tinha a certeza, evitava um futuro
indesejado, tanto para ela como para os outros. Teria
que decidir o seu amanhã. Recusava-se a empatar a felicidade de alguém, enquanto ainda tivesse oportunidade de escolha.
Nessa noite, antes
de
dormir, Francisca chamou
algumas das
recordações mais importantes que fantasiavam na sua memória. A sua especial amiga,
Joaninha,
tomava o primeiro lugar. Lembrou-se
inclusivamente
da pessoa que lhe fizera a oferta, alguém
que tomara um lugar
especialíssimo no seu coração,
alguém que jamais esquecera.
Guardava com imenso carinho as
recordações da sua adolescência. Para além de ser
uma
criança bastante divertida, achava-se tímida e discreta. Estava consciente das várias dificuldades e necessidades acumuladas à
sua volta, que
a obrigavam a concordar com a privação do menos útil
para assim construir uma vida mais serena. Por isso fechara
bem a porta dos seus sonhos, trancando assim os desejos mais simples,
para,
de mansinho, enriquecer
todos os seus sonhos. Faltava
quase tudo para conseguir uma vida mais rica e
mais justa. Era um nível de vida desconhecido na
altura, mas algo que agora fazia enorme falta. Sim… a orientação é precisa…
Tinha consciência das dificuldades
dessa época
visto que as sentia na pele. Sabia
ver e sentir, o quanto, a vida, era complicada e exigente,
sabia o difícil que era ter que seguir as regras
do dia-a-dia.
Tudo isto era absorvido pelos olhos da criança que,
habitava nela. Sentia-o exatamente como ela era,
em ponto pequeno…
Francisca recordou-se de um dia três de Abril,
Um sábado. Foi diferente, porque era Páscoa e, nesse dia completara dez
anos de idade. Ninguém se apercebeu, como
costume, foi mais um dia igual a outros. Mais uma data
alheia, ignorando o
que para Helena tinha um
valioso significado. Era uma data, inesquecível,
era a sua entrada na pré-adolescência.
Não
era costume, nem
nunca
fora
sequer habituada a receber algo para assinalar
esse dia. Para ela seria
uma
data de máxima importância,
mas sabia que para os outros seria apenas mais um ano deixado
para trás, desperdiçado com as sobras da criança que foi… e ainda era…
Francisca ansiava sempre pelo ano seguinte, pois estava consciente de que era mais um pequeno passo em direcção ao futuro, à mulher desejada,
que cada vez mais
queria ser. Fazer anos, era um sinal de sabedoria, de amadurecimento e de aprendizagem.
Desejava ansiosamente
sair da sua concha,
rumo à adolescência tão pretendida. Onde ambicionava satisfazer
os desejos imaginados. Queria
poder entrar lentamente
nesse universo interessante, mas desconhecido. A
impaciência
perante esse novo futuro reinava, ansiava
viver momentos que
seriam únicos e belos. Como seria ser e descobrir a mulher perfeita,
a mulher
ideal? Imaginava
e tentava construir desde
então o seu futuro ilusório.
Vivia-o exatamente como qualquer criança,
na sua passagem ao mundo da adolescência. Sabia o quanto
foi
e era difícil
lidar com a privação
de
quase tudo, simplesmente porque a vida se mantinha bastante problemática em todos os sentidos. Tinha
aprendido o principal, a apreciar a enorme beleza da vida e o que ela possui de mais valioso.
Talvez o verdadeiro valor da vida seja invisível… e por ele ser
tão
grande se torna inalcançável à visão. Ou
talvez simplesmente
porque é um puro sentimento que
nasce do olhar e mora no coração,
como todos os
outros… e por isso não se possa ver.
Francisca não
era a única a sonhar com o seu futuro, nem foi sequer a única a atingir essa linda
idade, mas foi a única que recebeu o
presente ambicionado, durante os tenros anos da sua infância.
Na manhã seguinte
foi dia quatro de Abril - domingo de Páscoa. Ao sair do quarto,
deparou-se com o seu pai, que caminhava
lentamente ao seu encontro. Com maneiras afetuosas, aproximou-se
dela, de sorriso bem alegre e carinhoso, mãos atrás das costas, e
no final uma expressão bem satisfeita! Denunciava esconder
algo! Notava-se demasiado bem o volume
da
grande caixa, destapada,
pois
não havia dinheiro
para
comprar papel de embrulho.
Tentava ao
máximo manter a surpresa
anónima, mas só conseguia despertar a sua curiosidade. O coração de Francisca saltava de tanta euforia, palpitava de
tão cheio de
vontade de descobrir aquela oportunidade que a vida lhe oferecia. Ansiava por algo positivo, talvez bastante pretendido. Então, com atenção e cheia de orgulho, ouviu seu pai dizer:
- Tenho uma surpresa para ti, sei que vais gostar muito, aliás tenho a certeza!
Mas
não me foi
possível consegui-la
mais cedo, mais vale tarde do que nunca, não é? Estendeu-lhe
as mãos com a caixa e, continuou:
-Quero dizer-te também que sinto um grande
amor por ti e sinto-me muito orgulhoso em ter-te
como filha. Quero desejar-te muitas felicidades
e que Deus nunca se esqueça de ti.
Dizendo isto, uma lágrima de felicidade quis
fazer-se mostrar
no canto do seu olho, respirou fundo
e continuou:
-Só com a força de viver, consegui
superar o desgosto
deste caminho tão difícil
e muitas vezes indesejado.
Mas, graças a ti,
tornou-se bastante
enriquecedor. Que Deus te abençoe, minha filha!
Ao ouvir aquelas palavras tão bonitas
e preciosas, Francisca transbordou de alegria. Ficou tão contente e
comovida, que não encontrou o que dizer. Apenas o
abraçou.
-Eu também
pai,
obrigada por tudo. Foi o que unicamente conseguiu lançar pela boca fora, porque
o restante ficou entalado na garganta. Só encontrou forças na grande curiosidade, ao pegar na enorme
caixa e… acabar de abrir. Francisca depositou
naquele momento
toda a emoção e alegria que
pudesse existir nela. Assim que verificou
conter o que imaginava,
deu pulos de felicidade e
quase explodiu de contentamento.
- Oh pai… obrigada… é linda, linda! Com um forte abraço, procurou retribuir-lhe a enorme alegria que a contagiava.
Vindo de uma pessoa tão querida, aquelas palavras
e gestos, ficariam para sempre gravadas no seu pequeno mundo, tatuadas no seu coração e,
eternamente, coladas no livro da vida. Aquecendo o mais pequeno grão de sentimentos, que teimavam arrefecer algum pedaço de defesa, existente
na sua vida,
ainda tão verde.
Seus olhos castanhos esverdeados cintilavam
de tanta felicidade, ao denunciarem a alegria e o desejo contidos. As lágrimas que queriam sair pelos cortinados dos seus olhos, eram de felicidade. Era tanta a euforia e o contentamento sentidos por
Francisca, que nem sabia se havia de chorar ou se havia
de rir. Mas se fosse só um sonho, era bom
demais e recusava-se a despertar!
Era uma boneca,
sim… aquela que sempre desejou e aquela que sempre idealizou. Sempre
pensou ser impossível satisfazer, pois era só um
sonho… e os sonhos não se realizam. Principalmente
naquele canto do mundo onde só em sonho é possível alcançar os desejos.
Mas agora era real, de olhos bem
abertos
ela tinha aquela maravilhosa visão. Será que o sonho
saiu da ficção para a realidade? Após tanto tempo de espera, a recompensa chegava, permanecia à
sua
frente e pertencia-lhe inteiramente.
Era linda e quase tão grande quanto ela.
Possuía uns cabelos sedosos,
ondulados e cor de cenoura, chegavam-lhe
à cintura, cheirando otimamente. Umas enormes pestanas negras, contornavam uns
belíssimos olhos cor de carvão, pintados
com
a cor da moda, um azul céu muito
bonito. Para completar essa beleza facial, uns lábios carnudos, cor de sangue e entreabertos davam a impressão de querer falar com ela.
Vestia
umas
roupas bastante modernas que lhe assentavam lindamente. Um vestido cheio de
folhos cor de laranja e dourado
que descia até aos joelhos. Tinha uma fita enrolada
na cabeça a condizer com o restante, a fazer sobressair os lindos
cabelos que lhe caíam pelas costas.
Quando a
tomou nos braços com toda a delicadeza, sorriu-lhe de encantamento, parecia-lhe
um autêntico bebé, com uma expressão repleta de
tranquilidade. A minha princesinha linda… pensava ela. Não demorou
muito para sair a correr, com a
boneca nos braços, e apresentar,
a sua nova hóspede a toda a vizinhança.
Foi um Domingo de
Páscoa muito especial para Francisca,
pois recebera aquela maravilhosa
surpresa. Seguido da missa e do almoço, um pouco diferente, com mais fartura e
com os tradicionais
petiscos, o qual ela havia ajudado sua mãe a
preparar na
Eram sempre feitos com antecedência e ela aproveitava aquela oportunidade
de aprender algumas receitas tradicionais. Como o
delicioso folar de carne, biscoitos
ou bola de azeite, que eram
confecionados com produtos regionais. A
fogueira era acesa, no enorme
forno de lenha,
juntamente
com
outros vizinhos, que também iam
preparar os seus petiscos. Apreciava e aprendia, ao mesmo tempo que saboreava
os que sua mãe lhe
preparava, especialmente.
Nessa noite
deitou a boneca com ela, admirou-
a mais uma vez e viu que fechava os olhos, fingindo dormir. Nela encontrou um abrigo apaziguador e amigável, que só existe na ingenuidade de
criança.
Tornou-se
na sua principal confidente e irmã
mais nova, aquela
que
nunca teve a sorte ou o azar
de conhecer. Partilhava
com a sua linda menina, todos os seus medos e emoções. Baptizou-a com
o nome de Joana e contava-lhe todas as tristezas e
alegrias, chegando ao ponto de lhe pedir conselhos,
apesar de ela nada dizer.
Talvez
fosse essa a principal
razão de a considerar a
sua amiga mais íntima e de maior
confiança. Justamente
porque não existiam
sentimentos
negativos,
mas
infelizmente também nada de positivo. O que era o menos importante,
pois Francisca possuía muitos
sentimentos bons que, segundo
ela, eram suficientes para as duas.