AQUI DEIXO MAIS UMA PARTE DO MEU LIVRO: O PODEM ADQUIRIR AQUI:
Fazia sempre por ajudar o máximo possível,
pois esforçava-se por isso, para depois saborear o
gosto do inverso. Mas apreciava acima de tudo, o resultado
desse gesto nobre. Gestos de bondade e humanidade, os que ali eram vividos, mas no geral,
também
cada
vez mais raros. Valorizava cada vez
mais essa dedicação, com otimismo, vaidade e perseverança.
Sim, porque podia-se sempre fazer melhor, mas a boa vontade nem sempre estava presente.
O empenho que sentia em satisfazer os desejos dos outros, ajudava-a a concretizar
um pouquinho o seu. O sonho que fora aprisionado
por
ela, por vezes saltava-lhe do coração. Quando alguma coisa a sufocava e a impedia de seguir o seu caminho na
vida, Francisca
desejava muito viver e dizia-se que nada era em vão, que tudo vale a pena, mesmo só para aprendermos um pouco mais da vida, porque
viver não custa,
o que custa é saber viver.
Francisca gostava, muito,
de escrever. Desde a adolescência que ela transmitia
para o papel, poesias variadas, pensamentos verídicos e até histórias para crianças. Sim, ela agora tinha tempo para isso, e muito mais. Estava
sempre
disponível, para ajudar, quando e no que fosse possível e, claro no que pudesse.
Foi assim que, após cinco anos de estadia naquele lugar, conseguira um computador que tornaria a sua escrita muito
mais facilitada e legível... algo que valia a pena ler.
Conquistou com facilidade, o carinho e a simpatia de muitos residentes. Outros recusavam-
se simplesmente a mostrar o pouco de
bondade que
ainda tinham e podiam partilhar.
A revolta sentida era a principal culpada,
impedia apenas essa demonstração de afeto. Os
atos de amizade eram cada vez mais difíceis, para
alguns. Recusavam-se
simplesmente a mostrarem
esses sentimentos, enterrando-se cada vez mais fundo,
no abismo que eles próprios criavam.
Mas mesmo assim, ela tentava entendê-los
e queria encontrar uma solução viável.
Dizia que apesar de tudo e, infelizmente, ainda existiam
casos piores, casos sem remédio nenhum. Só para aliviar um pouco mais, essa
frustração, esse ar pesadíssimo e que permanecia constante naquela casa. Para
alguns, a força de viver ia-se esgotando, mas, apesar disso, ela dizia-se constantemente
a si própria que não lhe era permitido desistir.
Cativou com doçura e carinho
a atenção,
repleta de simplicidade de uma velhinha com oitenta
e poucos
anos. Chamava-se Joaquina
tinha adquirido, involuntariamente, uma doença de nome: Alzheimer.
Sempre que a via dirigia-se, imediatamente, ao seu encontro. Só para lhe dar um abraço e
um beijinho, cheios de ternura e simpatia, como se de uma criança se tratasse. Embora fosse isso o que
muitas vezes parecesse. Foi infelizmente, o primeiro e último lar ou residência que conheceu, pois a sua patologia já estava bastante
adiantada, agravando-se cada vez mais com o
passar dos dias.
Esquecia-se constantemente das coisas mais simples. Quem
era,
onde estava ou se tinha família… coisas que para ela tinham um enorme significado
e um
grande valor moral. Tinha família, duas filhas, embora
o marido já tivesse
partido
desta vida. Por vezes recordava-se deles, tinha
netos que vinham visitá-la, mas raramente, apenas quando caia nas malhas da lucidez.
Francisca era considerada por ela como sendo sua neta e sentia-se feliz com tal facto. Conseguira assim ter a avó que não chegou a conhecer, por
isso lhe dedicou este poema:
Minha avó emprestada
Tuas palavras ditas ao acaso!
Cheias de ternura e por vezes tão banais,
em frases tão insignificantes,
mas que fazem a alegria
sobrepor-
se à tristeza!
Teus gestos tão simples,
carregados
de doçura
fazem renascer a bondade,
tantas vezes
perdida
ou deixada escondida
Teus beijos e abraços carinhosos
fazem-me lembrar a avó que,
infelizmente,
não conheci,
mas tantas vezes imaginei!
Tua pele enrugada
pelas ondas do tempo,
mostra ainda a sabedoria
que te resta dos
tempos longínquos!
O teu sofrimento acabou,
deixaste esta vida…
mas não deixarás os nossos corações…
nem o nosso pensamento!
Simplesmente
porque nós não deixamos,
minha avó emprestada!