sábado, 24 de setembro de 2011

O PERFEITO DO IMPERFEITO parte24

 PARA QUEM SEGUE O MEU LIVRO, O PERFEITO DO IMPERFEITO, SENDO TALVEZ UM BOCADO DURO MAS MUITO REALISTA, AQUI FICA MAISUMA PARTE.


   Filipa tinha conquistado quase tudo para ser feliz, faltava-lhe o principal, o que infelizmente era impossível dominar, ou seja, a saúde. Embora estando no início, estava consciente das dificuldades que esta doença lhe traria muito lentamente, era esse o motivo principal pelo qual a sua adolescência tinha sido tão pavorosa, repleta de indecisões, e amadurecendo sempre na expectativa dum amanhã melhorado, de um amanhã ausente dos enormes medos e angustiantes incertezas.
    Havia sempre um fiozinho de receio amargurado no seu coração, escondido logo por detrás de onde habitava o brilho incessante do amor. O principal sinal estava rodeado de indecisões e dúvidas constantes. Dúvidas que davam origem ao fracasso e à insegurança, as que ninguém desejava aceitar nem desvendar.
   Viu-se sem qualquer obrigação para acabar os seus estudos mas desejou concluir esse objectivo, porque o futuro é incerto, talvez viesse a precisar um dia mais tarde. O amanhã é sempre imprevisível.
   Filipa ficou sozinha na vida, os laços familiares extinguiram-se.
   Restou da sua família um primo da parte do pai, que neste momento se encontrava internado num lar para deficientes motores, pois as suas capacidades eram mínimas.
   Chamava-se Jaime e era filho do irmão mais velho de seu pai. Filipa não o chegou a conhecer. Tinha pouco mais de dois anos, quando o pai de Jaime pôs termo à vida, tudo por desgosto, porque perdeu a mulher, ao dar à luz uma menina, imensamente desejada.
   Tudo isto aconteceu há quase dezassete anos, quando Jaime vivia os dezasseis anos de sua existência já bastante dolorosa, pois sentia-se culpado por esse desgosto, sem o ser. Jaime era um menino muito meigo e obediente, ficando ao cargo de sua avó paterna, na casa que os viu nascer.

   Aconteceu no auge da adolescência de Jaime quando esta maldita doença se começou a manifestar, e a ocupar lentamente o corpo de Jaime, cheio de vitalidade e optimismo, deixando-o inseguro e revoltado.
   Perto dos cinco anos de idade encontrava-se Filipa, sempre atenta a tudo isso, pois começava a despertar o seu interesse abrindo o apetite à vida.
   Lembra-se vagamente, do primeiro e único grande amor de Jaime, com dezasseis anos apaixonou-se perdidamente por uma jovem da mesma idade. Soube que ela foi “forçada” pelos pais a terminar o namoro, para desgosto dele, e viu-se obrigado a lançar a amada para os braços de outro, sendo forçado a “casar” com a doença.
    Oito meses depois, a tragédia bateu novamente à porta e exactamente da mesma maneira. Sua mãe morreu ao oferecer ao mundo mais uma vida, e seu pai quis seguir o mesmo caminho que ela, para não deixar a oportunidade em vão, aquela de se reencontrarem “numa vida melhor”, dizia ele, com toda a certeza.
   Deixando então Filipa órfã, aos cuidados de sua querida mãe, aquela que repentinamente viu a escuridão da vida a penetrar por todas as frestas da sua casa adentro, e invadirem a privacidade alheia. Ela era a grande fortaleza da família, e tinha a certeza de que não a poderia ter entregue em melhores mãos.
   Pois foi a única avó que ela conheceu, já perto dos oitenta anos, adoeceu, apanhou uma enorme pneumonia que a levou à morte.
    Vendo-se com catorze anos e sozinha na vida. Filipa resolveu fugir daquele lugar, e dar asas ao acaso, refazendo a vida longe dali, do sítio onde o azar fez o seu ninho e a infelicidade a sua cama.

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